EU NÃO ARDO NAS SOMBRAS, CONSTRUO ALVORADAS!...

sexta-feira, 12 de setembro de 2025

DESPERTAR


Quando me deito e a penumbra da noite cai sobre mim, sei que o sono me leva apenas a meio caminho do que, verdadeiramente, espero. Porque é no instante em que chegas, silenciosa e intensa, que os sonhos ganham forma e movimento. As metáforas que surgem na minha boca não são simples palavras, mas rios acesos de desejos, que procuram na tua pele a ternura e o calor de um arbusto em chamas. A cama deixa de ser apenas lugar de repouso: torna-se altar, onde cada gesto teu desperta em mim a linguagem profana e secreta do amor. Acordas-me, não apenas do sono, mas da letargia do mundo; trazes-me de volta ao fogo primeiro, aquele que antecede qualquer aurora. És claridade que rasga a escuridão, tempestade que me prende e me liberta ao mesmo tempo. E quando vens sobre mim, não é apenas o meu corpo que desperta – é a minha essência inteira que em ti se reconhece, o amante que em ti renasce. Cada metáfora que invento diante da tua nudez torna-se vacilante, porque nenhuma palavra alcança a vibração dos teus suspiros, nem o arrepio que deixas na pele. Tu és o poema que a minha língua aprende no toque, és a liturgia do prazer que me faz crer no divino, escondido na sombra lancinante da tua cintura. E assim, entre o peso dos lençóis e a leveza do teu corpo, descubro que o verdadeiro despertar não vem do rumor manhã, mas do instante em que te deitas sobre mim e me devolves ao mundo, com o sabor húmido da tua presença. 



albino santos
* Reservados Todos os Direitos de Autor

quinta-feira, 11 de setembro de 2025

A TUA VOZ


Quando sonho contigo, escuto um timbre de voz que conhece bem o murmúrio do fogo. E não há nada que me pertença nesse instante – porque tu me arrancas de mim próprio, me entregas às tuas chamas e me pões a arder como se cada palavra tua fosse uma centelha que não se apaga. A tua voz não me é estranha – é como se a tivesse esperado desde sempre, adormecida dentro de mim, e que agora desperta, convocando-me a escutar o ardor suave, o fogo íntimo, o canto da chama que só tu sabes pronunciar. A tua voz não fala: ela invade, ela reclama um lugar dentro do meu peito, e eu pego fogo só por te ouvir. É uma chama que arde sem piedade, mas que se sente como o ardor de uma caricia. O som da tua voz, atravessa-me com o ímpeto de quem não teme ferir, porque o ferimento não é dor, é prazer. É fogo que não destrói, que se consome com uma ternura feroz. E, diante de ti, não sei se desejo apagar essa febre ou alimentá-la com o meu próprio corpo. E quando os teus lábios se movem, sinto o mundo estremecer: o tempo perde forma e dimensão, e tudo o que existe, converge na vertigem de me lançar nos braços da tua voz. Há um poder secreto em ti – não é só a beleza do teu corpo ou o desenho da tua boca, mas a voz, esse feitiço ardente que me chama como se tivesse o direito de me possuir. E como eu quero ser cativo do teu murmúrio! Ser a lenha que a tua chama devora, o silêncio que a tua voz rasga. Porque em ti, não existe apenas fogo: há a promessa do abismo, o êxtase de me perder sem retorno. E eu já não temo o que arde. Só temo a frieza do mundo onde não exista o murmúrio do fogo que emana da tua voz quando te sonho.

 


albino santos
Reservados Todos os Direitos de Autor

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

DE RAMO EM RAMO

Subo por ti de ramo em ramo, não como quem procura o cimo de uma árvore, mas como quem persegue a respiração secreta da aurora. Cada degrau da tua presença é um convite ao desconhecido: a vertigem doce de me perder na altura onde o teu silêncio floresce. O ar que te envolve tem o perfume das promessas ainda intactas, como se cada folha fosse um sussurro guardado para os meus lábios. E quanto mais avanço, mais descubro que não é o destino que me chama, mas o percurso errante da tua essência, o labirinto de luz e sombra onde me perco para, em ti, me poder reencontrar.

Há um lume nas tuas manhãs que não se vê, apenas se sente: é claridade que se insinua, um calor secreto que desponta entre as frestas do dia. Subir os teus ramos e aproximar-me de ti é como encostar o ouvido à pele da terra e ouvir o rumor do coração escondido no mundo. E quando enfim chego à altura do teu olhar, não encontro o fim da subida, mas o início de uma outra ascensão. Porque em ti, não há cume nem fronteira: há sempre um horizonte que se estende mais além, uma chama que, mesmo quando se apaga, renasce sempre, mais alta, mais viva, mais pura. Sou viajante da tua íntima eternidade, e cada ramo que me sustenta é já um prolongamento do teu corpo invisível, esse corpo feito de memórias, de vento e de silêncio. Colher em ti o lume das manhãs é, afinal, acender-me mais uma vez – e deixar que, em ti, o mundo desperte de novo.

 


albino santos
* Reservados Todos os Direitos de Autor

sexta-feira, 5 de setembro de 2025

SOU O TEU SEGREDO









Sou o teu segredo de todas as horas. Habito o intervalo entre o teu suspiro e o teu silêncio. Sou o pensamento escondido que se infiltra sem pedir licença, o fogo discreto, a febre em fúria que guardo em mim como quem carrega uma chama escondida no peito. Sou a lembrança quente que se acende no teu corpo quando a noite te envolve, o eco invisível que te percorre quando pensas estar só. Sou a vertigem que se instala nos teus gestos mais simples, transformando um olhar num desejo e uma palavra num longo sussurro. Sou o teu segredo quando o dia nos exige distância, mas também quando a noite, cúmplice, nos oferece amorosamente o seu manto. Não preciso de nome, quero apenas sentir o calor do teu corpo, a tua respiração pousada sobre mim e os meus braços envolvendo ternamente a tua cintura. Porque serei sempre a luz que te arde entre os lábios e o fogo infatigável que te consome por dentro. No tempo suspenso do nosso desejo, sou a chama que nunca se apaga, a presença que se deita contigo quando todo o mundo dorme. E quando na solidão dos teus lençóis, acreditas que ninguém te observa, sou eu quem desperta os teus desejos mais profundos. Sou a chama que se prolonga no teu ventre, o murmúrio que pede mais, o desejo que não se deixa calar. De todas as horas que passam pela noite, eu sou a mais íntima – aquela em que os teus olhos fechados revelam mais que qualquer palavra. Ali, sou o sol da tua noite, e tu és a minha eterna exaltação.



albino santos
* Reservados Todos os Direitos de Autor

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

A NASCENTE


Deve haver, algures, uma nascente escondida, uma fonte primordial onde brota a água que me percorre. Não sei onde nasce – se no fulgor do teu olhar, se no silêncio que se instala quando a tua boca adivinha a minha. Apenas sei que em ti tudo corre, tudo flui, tudo me alcança, como um rio que sempre encontra o caminho para o mar. És a nascente invisível que me surpreende no gesto mais simples: no modo como deslizas os dedos pelas tuas margens quando a noite se cobre de sedução. É aí que começa a corrente que me envolve e atravessa com as águas rugosas de Setembro. E eu, ao receber-te, torno-me num mar imenso, de águas claras a arder ao vento. Um mar que abre uma enseada para receber o curso rebelde e infatigável das tuas águas, e se deixa moldar pelo ímpeto da corrente. Sinto que és nascente e rio, vens de longe, de lugares que desconheço, e no entanto é em mim que desaguas, é em mim que repousas. Não importa onde começa a tua água, o que importa é que nela me reconheço, nela me recrio, e nela me perco para me encontrar. Não és apenas a água que se dissolve em mim e mata a minha sede, és também a sede que me estimula a vida. És o rumor incessante do rio que me atravessa, és o segredo eterno da longínqua nascente que não preciso ver para saber que existe – porque em cada gesto teu, o mundo inteiro começa a correr ternamente em mim.



albino santos
* Reservados Todos os Direitos de Autor

domingo, 31 de agosto de 2025

QUANDO ERA VERÃO NA TUA BOCA





 



Quando era Verão na tua boca, o meu nome era um barco. E eu o navegava, sem âncora nem porto, perdido e encontrado ao mesmo tempo. O calor do teu hálito era o vento que me impelia, e cada sílaba que me devolvias com os lábios era uma maré irresistível que me arrastava. Não havia um horizonte fixo, apenas a vertigem de seguir-te, de deixar-me levar pelo fluxo secreto que habitava entre a tua boca e a minha rota imaginada. E quando sorrias, o mundo inteiro incendiava-se de luz. Havia no teu sorriso aquele gesto de eternidade que só o mar conhece quando beija uma praia pela primeira vez. O meu corpo sem saber, foi-se ajustando às tuas correntes, e cada beijo teu era um novo litoral: uma enseada para o repouso, um rochedo para a vertigem, uma tempestade onde eu queria naufragar. Dentro de ti, a palavra “eu” deixava de fazer sentido. Tornava-se um pronome dissolvido, espuma breve no oceano da tua boca. Tu sabias devolver-me esse nome, mas nunca o dizias da mesma forma: Umas vezes um murmúrio quente, outras, um suspiro abafado, ou silêncio carregado de desejo. Era nesse jogo, nessa oscilação, que eu me descobria – não navegante, mas embarcação rendida, corpo entregue ao teu corpo. E cada beijo era muito mais que beijo. Os lábios tocavam-se e tudo o resto desaparecia – as ruas, o tempo, até o ar que respiravamos. Ficava apenas o rumor das ondas, o calor do Verão, a vertigem de estar em ti como quem mergulha sem voltar à superfície. Quando era Verão na tua boca, eu não era apenas um barco, era a própria viagem. E tu eras o mar inteiro, vasto e infinito, a chamar-me para sempre.



albino santos
* Reservados Todos os Direitos de Autor

sexta-feira, 29 de agosto de 2025

NOITE


 

Toma-me noite.
Sem sombra de amargura, entrega-me ao teu silêncio profundo, como quem abre os braços para um mergulho inevitável. Serei a tua seiva secreta, dissolvendo-me em teus véus escuros, até que não reste de mim senão um sopro que te percorre. Deixa que me disperse em ti, como um punhado de estrelas que se desfaz no vento. Quero perder-me no calor da tua escuridão, sentir a tua respiração roçando a minha pele, e descobrir no fundo do teu corpo imenso a promessa de um repouso ardente. Não venho com luto, nem com a frieza dos que temem. Venho como quem deseja, como quem se entrega sem defesa. Em teu silêncio, encontro a música secreta que me chama. Em tua sombra, o contorno do que sou se expande como sede, e quanto mais me desfaço, mais me torno teu. Noite, toma-me. Faz de mim o rastro que se mistura ao teu fascínio. E que, disperso em ti, seja eu – paradoxalmente – mais teu do que nunca.



albino santos
* Reservados Todos os Direitos de Autor