Rasgo o infinito como quem abre
uma fenda no próprio silêncio do tempo, e é então que o mar, guardião das vozes
invisíveis, responde ao apelo dos meus sonhos. Não responde em palavras, mas em
presságios, em redemoinhos que arrastam a memória, em marés que sonham como se
fossem o pulso secreto da eternidade. O mar, com a sua vastidão, é o espelho do
inatingível. Cada onda que se ergue é um gesto de criação, cada espuma que se
desfaz, um segredo daquilo que o mundo esconde de nós. Nele repousa a
sabedoria das origens: antes da primeira palavra, havia apenas este rumor
profundo, este cântico líquido, de rosto azul, onde os deuses e as sombras se
confundem.
Quando o chamo, não é apenas água que me responde – São os destroços de paixões
afogadas, o eco de constelações de sonhos que se perderam na bruma, a
recordação dos mitos que deixaram de existir. É como o oceano fosse um imenso
sarcófago erguido sobre colunas de vento e sal, onde cada gota guarda um oráculo.
E eu, ao lançar-me nesse diálogo, compreendo que não sou um viajante, mas um
fragmento chamado de volta para à luz extenuada do teu peito, onde a sombra entra devagar.
Sonhar é, então, atravessar as
superfícies e tocar o indizível, como quem mergulha nos corredores secretos do
infinito. O mar não me consola nem me revela; ele me transfigura. Ele toma meus
sonhos como oferendas e os devolve em enigmas, para que eu jamais esqueça que a
vida não é resposta mas abismo em constante revelação.
albino santos
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