Depois de uma pausa necessária, para uma
intervenção cirúrgica, volto para a vertigem das palavras, onde o sonho nunca
morre. Mas fá-lo-ei sem pressas, apenas na medida em que isso me permita
continuar a manter com quem me lê uma salutar relação de partilha, afecto e
cumplicidade.
Volto.
Ao que me investe de ímpeto e de afecto. Volto. Ao rumor das linhas solitárias.
De vertigem e abandono. De solitário aconchego. Volto às minhas crenças. Ao
inconformismo, que eu deixei por aqui. Volto como quem volta de uma grande
viagem. Como quem, por fim, volta ao colo materno sugando o bico leitoso do
seio da mãe. Volto-me para contemplar tudo aquilo que eu já contemplei. Ao
mesmo argumento, às mesmas dúvidas, à palavra convulsa, impetuosa. Palavra espasmo
fora de hora, acrescentando o divino que a gente nunca sabe se existe. Palavra
que sai fora de todas as lógicas, indo ser livre entre sonhos e esquecimentos.
Volto-me para o confuso. Franco. Vazio. Volto para o solitário do poeta. Volto.
Mais urgente. Mais afectivo. Como um coreógrafo da mente que dança com o
sentimento dos outros. Como uma sombra cansada de sombrear o verde da montanha,
escorrendo o verde da tarde. E se eu tento descrever o que vejo, escrevo o
verde nos meus versos, que também são de esperança. Ou minto a paisagem e
coloro de negro a sombra vegetando o monte. Sem argumento. Sem minúcias.
É para
isso que eu volto. Para o verde da tarde. Assombroso. Insuperável. Para a
calmaria desse inferno de viver. A palavra esmorecendo. De um vazio sem fundo.
E só.
albino santos