Há algo teu que me toca, mesmo
quando não estás – é a tua sombra. Chega sempre antes de ti, entra pelas
frestas do meu quarto, escorre pelas paredes, invade o meu corpo como quem já
sabe o caminho. Sussurra no escuro e espalha pelo quarto o teu perfume. Depois,
silenciosamente, deita-se comigo, respira sobre a minha nuca e os seus
contornos moldam o lençol. Tem o peso exacto do meu olhar quando te dispo, sem
pressa, sem culpa, com aquela lentidão que os olhos pedem. Sinto o vestígio
morno da tua pele na minha, a lembrança do teu sorriso entreaberto, do teu
cabelo caindo desordenado sobre o peito. A tua sombra conhece os caminhos do
meu corpo, os atalhos da minha vontade. Toca onde tu tocavas... e onde não
tocaste, imagino que tocarias. Às vezes penso: talvez eu tenha amado mais a tua
sombra do que a tua luz. Talvez tenha sido nela que me perdi. Porque a tua
sombra não se deixa esquecer. É feita do que tu calaste, é o tudo o que não
concluíste, o desejo que continua a insinuar-se no teu olhar. Então fica
sombra!... Deita-te sobre mim como fazias e deixa que eu te sinta no calor da
noite. Porque entre o amor a luz, há sempre uma sombra que escorre pelas
paredes do meu quarto e invade o meu corpo como quem já sabe o caminho.
albino santos
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