TALVEZ UM DIA...

Sou um barco fatigado pelo rumor das vagas. Procuro nas marés o corpo exacto que me envolva a alma. O corpo em que navego vai à deriva, sulcando distâncias em caminhos sem tempo, já não vibra com a volúpia das ondas, nem exulta com o voo caprichoso das gaivotas. Sinto que pertenço às profundidades do mar, à imensidão dos oceanos, ao voo das aves que insistem em fazer-me companhia.

O tempo escureceu. Uma estranha neblina cerca o meu olhar. Apesar de estar habituado a olhar o mundo a partir das trevas, não sei se algum dia conseguirei dormir em paz comigo mesmo.

Contigo ausente e tão perto de mim, sinto cair a cabeça exausta sobre o peito, cruzo as mãos nas pálpebras do sono e deixo que os lábios procurem outros lábios onde habite um beijo de lua. Mas já não sei adormecer sem o teu rosto amoroso que me acalma a boca por dentro da saliva da noite. Talvez um dia, um rumor de vento me traga pelo menos o teu nome.  

albino santos

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