EU NÃO ARDO NAS SOMBRAS, CONSTRUO ALVORADAS!...

quinta-feira, 16 de outubro de 2025

A MINHA SOMBRA

            Agora só a minha sombra pousa em ti, como de uma carícia se tratasse. Ela desliza sobre a tua pele com a suavidade da brisa, que não se vê, mas que se sente – essa presença invisível que te toca sem pedir licença, que te percorre sem tu sentires, enquanto o luar da noite, cúmplice e silencioso, ilumina o sensual contorno da tua nudez. A minha ausência tornou-se um corpo leve, sombra errante que ainda te procura nos reflexos do amanhecer. E quando o mundo se cobre dessa luz dourada, é como se o tempo se suspendesse só para nos ver – eu reduzido a sombra, e tu, bela e nua, com a minha sombra percorrendo o teu corpo. Ali, pousada docemente em ti, onde outrora pousavam as minhas mãos – hesitantes, lentas, descobrindo-te como da primeira vez.
           Há no toque da minha sombra em ti, uma memória e uma ternura antiga que o tempo não apaga, feita de desejo e distância. Quisera que essa sombra tivesse calor, e que o seu perfil obscurecido pudesse enrolar-se no teu sono, incendiar-te a pele como antes fazia o meu corpo. Mas o que resta é isto: o eco de um toque, a lembrança que insiste em permanecer, o murmúrio que se deita sobre ti, quando a noite declina e o luar se derrama.
           Ainda assim, há uma beleza infinita neste quase nada – neste toque sem peso, neste roçar de ausência. Já que não posso habitar-te, deixo que a minha sombra o faça por mim, com a ternura de sempre. Que ela te envolva, lenta como uma confissão sem voz. E, quando a noite se for e tudo se dissolver na penumbra, tu saibas que mesmo no escuro, continuo a pousar-me, amorosamente, em ti.




albino santos
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